segunda-feira, 15 de dezembro de 2008
«Os Meninos e Outros Poemas»
quarta-feira, 10 de dezembro de 2008
segunda-feira, 8 de dezembro de 2008
"Do Intangível", de Pompeu Miguel Martins
A Editora Labirinto apresenta o livro Do Intangível, a mais recente obra Literária de Pompeu Miguel Martins, com tradução e prefácio de Victor Oliveira Mateus e grafismo de Júlio Cunha sob desenhos de César Taíbo.
A sessão de lançamento com a Presença do autor, está a cargo do crítico literário César Freitas, com inicio as 21h30, do próximo dia 9 de Dezembro (Terça-feira), na Biblioteca Municipal de Fafe.
Pompeu Miguel Martins Publica desde 1998. É autor de várias obras no domínio da ficção (poesia, romance, teatro e diarística). Sociólogo. Exerce actualmente o cargo de Director da Agência Nacional para a gestão do Programa Juventude em Acção, da Comissão Europeia.
sexta-feira, 28 de novembro de 2008
quinta-feira, 27 de novembro de 2008
quarta-feira, 26 de novembro de 2008
Lançamento do livro "Os Meninos e Outros Poemas", de António José Queirós
Fundador e director das revistas literárias Cadernos do Tâmega (Amarante, 1989-1995), Anto (Amarante, 1997-2000) e Saudade (em curso de publicação desde 2001, em Amarante), fez parte do Conselho de Redacção da revista Nova Renascença (Porto). De Dezembro de 1999 a Dezembro de 2003 foi director do Jornal de Vila Meã.
É autor de dois livros de poesia: Memória do Silêncio (1ª ed., Editora Justiça e Paz, Vila Nova de Gaia, 1989; 2ª ed., Amarante, Edições do Tâmega, 1994; 3ª ed., Editora Labirinto, Fafe, 2007) e Os Meninos e Outros Poemas (Amarante, Edições do Tâmega, 1993; 2ª ed., Editora Labirinto, fafe, 2008).
Poemas seus estão incluídos na antologia Os Outros (Vila Nova de Gaia, 2004) e em volumes de carácter colectivo, designadamente: Poesia de Amarante – Anos 80 (Amarante, 1984); Rosalírica (A Coruña, 1985); Poesía dos Aléns (Ourense, 1993); Junto às Águas Velhas (Braga, 1999); Vejo-te como se pode ver através desta chuva oblíqua (Porto, 2001); Eternamente Nós (Vila Nova de Gaia, 2001); Homenaxe Poética ao Trobador Xohán de Requeixo (Chantada, Galiza, 2003); Afectos (Editora Labirinto, Fafe, 2006 e 2007); Um poema para Fiama (Editora Labirinto,Fafe, 2007); Um Poema Para Ramos Rosa (Editora Labirinto, Fafe, 2008)
Alguns dos seus poemas estão traduzidos em espanhol, italiano e francês.
É membro da Associação Portuguesa de Escritores e da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto.
quinta-feira, 13 de novembro de 2008
Labirinto edita "(Des)encantos de uma Vida", romance de estreia de Liliana Silva
No próximo Domingo dia 16 de Novembro, a editora Labirinto lança o livro " (Des) Encantos de uma Vida " da autoria de Liliana Silva.
A obra é apresentada, pelas 16 horas, na Biblioteca Municipal de Caminha, pelo escritor Carlos Vaz.
Ao longo das 179 páginas, a autora retrata a vida de uma de uma mulher que, a um dado momento da sua vida, se vê vítima de maus-tratos. Esta mulher tem a força para lutar e para mudar o seu futuro. É uma forma de encorajar todas as vítimas destas crueldades e de as fazer acreditar que se pode amar duas vezes.
Existe sempre a possibilidade de se voltar a ser feliz. Basta acreditar!
A Luísa, vai lutar com todas as suas forças contra os desencantos da sua vida.
“Nada é eterno, tudo é efémero. Até a dor”
Liliana Sofia Bouça da Silva, nasceu em Esposende, no dia 7 de Julho de 1978.
Licenciada em Português-alemão pela Universidade do Minho, é professora do ensino secundário.
(Des)encantos de Uma Vida é o romance de estreia de uma jovem autora que nos descreve, de uma forma bem realista, um dos maiores flagelos da nossa sociedade.
Um livro actual que cativa o leitor da primeira à última linha.
segunda-feira, 20 de outubro de 2008
Prémio Internacional de Poesia ‘Palavra Ibérica’ 2009 para Maria do Sameiro Barroso
terça-feira, 14 de outubro de 2008
Labirinto Homenageia Ramos Rosa e Agripina com a Edição de duas antologias poéticas:
As obras serão apresentadas pela jornalista e escritora Maria Augusta Silva e conta com a leitura de poemas dos autores presentes que integram as antologias. A sessão culminará com a entrega a António Ramos Rosa do Prémio do Núcleo de Artes e Letras de Fafe, recentemente alcançado com a obra poética “A Rosa Intacta”.
Segundo João Artur Pinto, editor da Labirinto, estas duas antologias, constituem por si só uma pérola literária e inserem-se no projecto que a editora tem de anualmente homenagear a Poesia, através do tributo a um ou mais poetas, evocando datas comemorativas como o Dia Mundial da Poesia, o Dia do Autor Português, ou ainda, como é o caso, o aniversário de um dos autores, celebrando a Poesia e, consequentemente, dar continuidade ao propósito inter-geracional a que a editora se propôs desde do início.
Como refere Maria do Sameiro Barroso, “prestar homenagem a grandes vultos da poesia portuguesa contemporânea, dando expressão a um registo de proximidade afectivo-poética àqueles que, de forma mais ou menos explicita, neles prolongam a sua centelha criativa, foi um desafio que a Editora Labirinto lhe colocou e que, desde logo, aceitou.
António Ramos Rosa, personalidade cimeira e dialogante e Agripina Costa Marques, esposa e companheira do Poeta, também autora de uma obra poética notável, foram os primeiros escolhidos para esta primeira homenagem, conjunta, a um casal de excepcional cumplicidade e dedicação à Poesia”.
Esta iniciativa, mereceu o apoio da Câmara Municipal de Fafe e da Câmara Municipal de Faro, através da aquisição de alguns exemplares.
Colaboram na antologia “Um Poema Para Ramos Rosa”, os seguintes autores:
Adelino Ínsua, Albano Martins, Alexandre Vargas, António Carlos Cortez, António Graça de Abreu, António José Queirós, António Salvado, António Vieira, Artur F. Coimbra, Boaventura Sousa Santos, Carlos Poças Falcão, Carlos Vaz, Casimiro de Brito, Daniel Gonçalves, Ernesto Rodrigues, Fátima Valverde, Fernando de Castro Branco, Firmino Mendes, Gisela Ramos Rosa, Gonçalo Salvado, Graça Pires, Inês Lourenço, Isabel Aguiar Barcelos, Isabel Leonor Forte Salvado, Jaime Rocha, João Rui de Sousa, Joaquim Cardoso Dias, Jorge Listopad, Jorge Reis-Sá, José Agostinho Baptista, José Félix Duque, José Jorge Letria, José Luís de Almeida Monteiro, José Manuel Mendes, José Manuel de Vasconcelos, Juliana Miranda, Luís Quintais, Manuel Madeira, Maria Alberta Menerés, Maria Augusta Silva, Maria Helena Ventura Maria João Cantinho, Maria João Fernandes, Maria do Sameiro Barroso, Maria Teresa Dias Furtado, Maria Teresa Horta, Paula Cristina Costa, Pedro Chagas Freitas, Pedro Sena-Lino, Pompeu Miguel Martins, Rita Taborda Duarte, Rosa Alice Branco, Ruy Ventura, Teresa Salema, Teresa Vieira, Urbano Tavares Rodrigues e Victor Oliveira Mateus.
Colaboram na antologia “Um Poema Agripina”, os seguintes autores:
Hernani Tavares (desenho de Agripina), Adelino Ínsua, Albano Martins, Alexandre Vargas,António Cândido Franco, António Ramos Rosa, António Salvado, Carlos Poças Falcão,Casimiro de Brito, Daniel Gonçalves, Ernesto Rodrigues, Firmino Mendes, Gisela Ramos Rosa, Gonçalo Salvado, Hélia Correia, Inês Lourenço, Isabel Aguiar Barcelos, Jaime Rocha, João Rui de Sousa, Jorge Reis-Sá, José Félix Duque, José Jorge Letria, José Luís de Almeida Monteiro, José Manuel Mendes, Manuel Madeira, Maria Alberta Menerés, Maria Augusta Silva, Maria Helena Ventura, Maria João Cantinho, Maria João Fernandes, Maria do Sameiro Barroso, Maria Teresa Dias Furtado, Maria Teresa Horta, Pedro Sena-Lino, Rosa Alice Branco, Teresa Salema, Urbano Tavares Rodrigues e Victor Oliveira Mateus.
segunda-feira, 13 de outubro de 2008
Labirinto Homenageia Ramos Rosa e Agripina
O evento terá lugar na livraria Barata de Entrecampos (Campo Grande 10B) - Lisboa, dia 17 de Outubro às 16h, e coincide com a data de aniversário de António Ramos Rosa, que receberá igualmente o Prémio de Poesia do Núcleo de Artes e Letras de Fafe, recentemente alcançado com a obra poética “A Rosa Intacta”.
As obras serão apresentadas pela jornalista e escritora Maria Augusta Silva.
Contamos com a sua presença!
segunda-feira, 14 de julho de 2008
Apresentação do livro do Padre José Peixoto Lopes – Vivências
Apresentação do livro do Padre José Peixoto Lopes – Vivências
Devo começar por afirmar, alto e bom som, que me prezo de ter como amigo o Padre José Peixoto Lopes.
Tanto quanto o conheço, é um homem activo, dinâmico, enérgico, empreendedor, diligente, que tem tido artes para conseguir levar a água ao seu moinho em tudo o que se tem metido. Por isso merece o reconhecimento da população da cidade, na qual me incluo.
O actual pároco da cidade, há mais de 15 anos, nasceu na freguesia de Regadas, em 2 de Dezembro de 1945 e ingressou na Congregação do Espírito Santo, em 1966, fazendo a sua profissão solene em 1977.
Foi missionário em África. Partiu para aquele continente em 16 de Março de 1973 e missionou em Angola de 1973 a 1975, na missão de Cuando, na diocese de Nova Lisboa, onde ensinou nas escolas da Missão, dedicando-se a campanhas de promoção higiénica e sanitária junto das populações. De 1977 a 1980, foi pároco do Tarrafal, na ilha de S. Tiago, em Cabo Verde, célebre por ter sido o local de desterro de inúmeros opositores ao fascismo. Professor na Escola Preparatória da localidade, o Padre Peixoto Lopes desenvolveu a sua actividade apostólica junto dos jovens. Promoveu a reparação de igrejas e capelas numa terra pobre mas de gente colaboradora.
Foi ainda professor no Seminário de Fraião, nos anos de 1984 e 1985.
Desde 1992, é o pároco da cidade de Fafe, por morte do cónego Leite de Araújo. Além disso, teve responsabilidades como pároco nas paróquias de Medelo, Fornelos, Serafão e Agrela, entre outras. Foi Vice-Arcipreste de Fafe.
No exercício da sua actividade pastoral, na cidade, tem procurado renovar a catequese e dinamizar a pastoral juvenil. Conferiu claramente um novo estilo à pastoral paroquial, com maior abertura, maior descentralização, maior responsabilização dos leigos, enfim, maior colegialidade na orientação da vida cristã com todos os responsáveis. Por sua intervenção, foi adquirida a residência paroquial, restaurado o salão da Matriz, construídas a capela de Fiéis de Deus, as capelas mortuárias, a igreja da Granja, bem como, mais recentemente, a magnífica Igreja do Sagrado Coração de Jesus, em S. Jorge.
Na paróquia de Fafe, coordena ainda o jornal semanal Igreja Nova.
Não conseguindo conter-se no domínio do seu múnus espiritual, deu-lhe para ter uma doença que, felizmente, é comum em muitos de nós – ser poeta. Aliás essa doença está mais disseminada que o sarampo e por isso se diz que Portugal é um país de poetas – diagnóstico que está ainda por confirmar.
A Vida é Sagrada foi o título dado ao seu primeiro livro de poemas, editado pela Labirinto em 2005.
Na altura da sua apresentação, e como que sintetizando o seu sentir poético, o autor debitava:
A minha poesia é mensageira
Da minha alma cristã, branda e fagueira,
Simples, muito directa e sentida!
Sem pretensões balofas de escritor,
Mas com simplicidade e com amor,
Digo o sentir cristão da nossa vida!
Surge, agora, a sua segunda compilação de textos poéticos, com o título Vivências – uma denominação que foi conseguida por consenso entre o padre Lopes e o editor João Artur Pinto – e que pretende retratar o universo multifacetado e abrangente em que se tem desenrolado a vida e a obra do nosso padre-poeta.
Vivências integra 91 composições de temática diversa, sujeitas a rima, a grande maioria das quais (88) em forma de soneto, quer o clássico (decassílabo), quer, em número muito menor, o de sete sílabas, e até variantes de menor número de sílabas.
O Padre Peixoto Lopes passou-me para as mãos os textos para uma presuntiva obra poética a editar pela Labirinto e a liberdade de organizar o seu conteúdo da forma que entendesse mais conveniente. Uma responsabilidade acrescida, a que não quis fugir, apesar dos escolhos de tal tarefa.
Depois de ler todos os poemas, entendi organizar o livro em quatro núcleos temáticos fundamentais, embora a divisão possa seguir outras linhas, em função da subjectividade de cada um. Cada cabeça sua sentença.
O primeiro grupo intitula-se “Reino de Cristo” e nele se integram os poemas que falam de Deus, de Jesus, enfim, da divindade.
O segundo grupo tem por título “Loas à Virgem” e engloba um pequeno conjunto de cinco poemas cuja temática basilar radica na exaltação da Mãe de Deus, a Virgem Maria.
“Pecador me confesso” é um terceiro núcleo de poemas de matriz religiosa, onde perpassam as preocupações e os desabafos metafísicos do poeta, no seu diálogo e na sua relação com o Criador.
Finalmente, “Biográficas e coisas da vida” assume-se como um conjunto de versos relacionando episódios da vida de José Peixoto Lopes, da sua ligação à terra natal e às actividades a que se foi ligando, encaixando-se ainda aqui os poemas de carácter mais prosaico, diríamos, profano.
Pela poesia de José Peixoto Lopes perpassa, como indelével fio condutor, a temática religiosa. Nem outra coisa seria de esperar dos poemas elaborados por um membro da hierarquia cristã.
Este é, assim, um livro de sublimação do sentimento religioso de um poeta perante Deus. Uma autêntica paixão de Cristo. Ou por Cristo, que vem a dar no mesmo.
Algumas ideias transmitidas pelos poemas de Vivências:
Por exemplo, a de que o cristão é a imagem divina na Terra. A de que é preciso amar (quem ama é filho de Deus/ fala a linguagem dos Céus/ tem a vida verdadeira) e perdoar, até aos próprios inimigos, como caminho de acesso à salvação. Amar sem medida deverá ser a essência do cristão. Tal como o bem-fazer sem olhar a quem.
Outra ideia é de que Deus deve estar presente na vida de cada cristão. O segredo de uma vida feliz é ter Deus sempre no seu caminho. Viver sem Deus é que é um duro tormento. Longe Dele só há sofrimento e dor, ilusões e falsa alegria.
O poeta rebela-se, assim, contra uma das componentes mais fortes do mundo actual, a descristianização:
Nesta moderna cultura
Reina a mais vil ditadura
Dum homem sem coração (…)
Sem Deus, sem lei, sem razão!
Para o autor, obviamente, o conforto é crer em Deus:
É para mim tão simples, tão gostoso
Acreditar em Deus, Pai amoroso,
Que fala ao coração da criatura!
Outra ideia ainda é a de que Nossa Senhora é a intermediária, a pequena ponte que liga a Humanidade ao Redentor. A Mãe da Misericórdia e do Perdão. São belíssimos, de resto, os poemas que dedica a Nossa Senhora, a começar pelas formosas “Loas à Virgem”, que merecem uma leitura atenta.
O poeta pecador se confessa, revelando não ser tão santo quanto devia, também ter dúvidas e hesitações, pedindo assim perdão a Deus pelos seus defeitos e garantindo procurar ser melhor e mais justo. O poeta crê na vida eterna e na vitória do Céu sobre o Inferno.
Mas o poeta gosta da vida e das gentes simples, como ele sempre foi. É a natureza que o ensina, como ao Alberto Caeiro, não a educação livresca.
Humilde no berço,
Esperto na escola,
Devoto no terço,
Doido pela bola.
Este o retrato elementar de um homem do povo, afinal, que vem de uma terra modesta (Regadas), que ama e celebra. Um homem que nasceu de gentes pobres, mas honradas, que lhe ensinaram o rumo verdadeiro. Que recebeu ordens sagradas, para ser mensageiro do Evangelho. Depois, andou pelo mundo, por vocação, a semear a Boa Nova e voltou ao seu benquisto torrão natal. Um homem para quem todo o universo é a sua terra (minha aldeia é o mundo), e todo o homem seu irmão, cumprindo a essência cristã que é o seu múnus, o seu destino, a sua condenação.
Um homem despretensioso, elementar, simples. Que escreve versos francos, acessíveis, comuns. Com alma e coração virados para o semelhante.
A minha musa não será fadada
Para voos poéticos ingentes;
Estará certamente inclinada
Para versos directos e correntes!
Não que seja inimiga declarada
Das bonitas metáforas luzentes,
Linguagem snobmente complicada,
Que passa ao lado das mais simples gentes!
Gosta das coisas simples e modestas,
Das belas romarias e das festas
Do nosso povo alegre e brincalhão!
Segue seu fado suavemente triste,
Vibrando com o belo que existe
No fundo do seu meigo coração!
A poesia do Padre José Peixoto Lopes não terá a beleza das bonitas flores, e seus aromas puros e refrescantes. Mas mostra as preocupações mais inquietantes, os pensamentos, as certezas, ironias e valores que estruturam a vida do poeta.
Não me seduz a forma mais cuidada
Da minha escrita, simples, delicada,
Que em mim nasce espontânea e sentida…
Embora se auto-flagele pela simplicidade e lhaneza dos seus versos, o poeta não pode deixar de considerar que deixa publicadas autênticas pérolas da melhor literatura que se pode ler.
Por exemplo, o poema intitulado Uma flor:
Fui ao meu jardim
Buscar uma flor.
Não era p´ra mim,
Mas p´ra meu amor.
Colhi uma rosa
Linda, perfumada.
Coisa mais formosa
Para a minha amada.
Fiquei tão contente,
Minha boa gente;
Que grande alegria!
Para meu Senhor
Foi a minha flor.
E p´ra Ti, Maria
Ou outro belíssimo poema, titulado Menina da trança, pela sua tocante mensagem, pela singeleza e naturalidade dos versos que nos lega:
Menina de olhar tão puro
com sorriso de Esperança,
terás um grande futuro,
menina da linda trança!
Menina com ar maduro
de alegria e confiança
iluminas o escuro
deste mundo em mudança!
Tantos meninos da rua
têm uma vida crua
sem brilho no seu olhar!
Procura linda donzela
mostrar que a vida é bela
se a gente souber Amar!
Vivências apresenta-nos o poeta José Peixoto Lopes no seu melhor. Mais maduro, mais depurado, aparentemente mais simples. Mas apenas aparentemente. A simplicidade é muitas vezes a máscara de um trabalho de sacrifício e de rigor em torno da palavra. Um trabalho de Sísifo para que a palavra resulte mágica, logo, poética.
Artur F. Coimbra
segunda-feira, 23 de junho de 2008
PELO SONHO
«Como terceira e última nota caracterizadora deste tipo de literatura destaca-se o simbolismo e a comunicação. Uma autêntica comunicação é a melhor motivação para provocar o desejo de ler, para saber escolher».Mais importante, ou pelo menos mais fundador, do que o conhecimento exaustivo das teorias literárias é a existência na pessoa do desejo de ler. E para que esse desejo se manifeste é necessário que a literatura chegue até nós de modo a que cada um possa sentir que há ali um lugar que é seu, uma interpretação que é sua, um entendimento único e intimo. Não se lê sem intimidade, sob pena de considerarmos estranho e eternamente outro o universo proposto, a que se não regressa pela impossibilidade que tivemos de não criar uma relação. Tal como no relacionamento humano, também a literatura começa por ser uma proposta de relacionamento interior e projectado de imediato na nossa irrepetível forma de ver e de sentir o mundo.Susana Afonso, neste seu primeiro livro, teve já presente esta ideia. Na forma como construi a obra, fê-lo de maneira a que quer a poética, quer o contexto, quer o conteúdo pudessem constituir-se como acrescentos ao que as crianças que a lerão irão sentir após a leitura. E o que sentirão elas? Provavelmente para algumas o questionar de situações pela primeira vez, o que é sempre um momento muito rico para cada um, a aprendizagem de conteúdos que vão desde as leis da física, da matemática, da música entre outros e o reforço da aprendizagem do sonho. «É pelo sonho que vamos» dizia-nos Sebastião da Gama e é certamente por aí que esta obra também se inscreve.Enquanto elemento socializador esta história de Jaques dá conta da existência de uma diversidade de modelos sociais, sendo que o confronto dos mesmos terá como consequência o alargar de perspectivas sobre a vida de cada um enquanto elo de ligação permanente à vida dos outros.A construção de uma personagem que vem de outro país para Portugal e que sente a inevitável estranheza da língua e da cultura é o primeiro dos desafios que Susana Afonso lança aos seus leitores, fazendo-os passar pela experiência que a leitura sempre proporciona para que com ela possamos sentir o personagem e com ele experimentar as sensações da interculturalidade. Por outro lado, ainda no registo dos temas da nossa contemporaneidade, a autora caracteriza o pequeno Jaques como filho de uma família de pais divorciados, experimentando a distância da mãe e dos irmãos criando aí uma espécie de argumento para o retomar do sonho e da fantasia. A distância da família que habita em Paris faz a ponte para uma certa mistificação de formas de vida urbanas, contrastando com o espaço de intimidade do pequeno Jaques, existindo neste livro, um incentivo ao romper de preconceitos, utilizando para isso a propositada desconstrução de ideais tipo. A autora consegue isso em vários momentos como são exemplo o Lobo, sempre encarado com feroz animal, aqui apresentado como personagem alegre e companheira, ou da madrasta, habitualmente conotada como um ser malévolo e em competição permanente com a figura da mãe, aparecendo neste livro como alguém a quem também compete a participação positiva no desenvolvimento afectivo do herói da história. O quebrar de preconceitos é um desafio civilizacional, continua ser para cada um de nós um desafio de todos os dias. É daí que surgirá uma sociedade mais justa e mais compreensiva resultando a justiça e a compreensão numa sociedade mais inclusiva que será certamente uma sociedade com mais paz, conforme todos ambicionamos. Do ponto de vista pedagógico, esta obra é também um elemento de exploração de temáticas que se relacionam com a educação cívica: desde a necessidade de protecção do meio ambiente à de mudança de hábitos quotidianos que farão com que possamos viver num mundo mais equilibrado e harmonioso. Porém, esta é também uma obra que poderá ser de grande utilidade para outro tipo de leitores que são os pais ou os professores, pelo que ela nos oferece enquanto instrumento de educação. Seja para a nossa vida diária enquanto pais, seja na planificação de uma aula sobre os conteúdos versados nesta história, «Viver Paris ao som de um pífaro» , é um útil contributo para que se leve a bom porto a discussão em torno de todas as questões que aí se levantam. Um livro que deixa no ar inúmeras perguntas e outras tantas possibilidades de actividades pedagógicas, de respostas, de levantar plataformas onde seja possível erguer nas crianças pensamentos maiores, cumprindo assim com aquilo que deve ser a principal missão de todos nós que contribuímos para a educação: ajudar a criar cidadãos que deixem ao mundo um mundo melhor do que aquele que encontraram. Foi exactamente isso que Susana Afonso fez, ao deixar o seu contributo e é com ele, pelo sonho e pela utopia, que nunca devemos baixar os braços nessa responsabilidade que é de todos, ajudar a enriquecer os sonhos das nossas crianças para que tenhamos a certeza que com isso lhes estamos a enriquecer os dias.
quinta-feira, 19 de junho de 2008
quarta-feira, 18 de junho de 2008
Labirinto lança inédito de Susana Afonso
A Labirinto apresentará ao público já no próximo dia 21 de Junho (Sábado), «Viver Paris ao som de um Pífaro – o Sonho de Jaques», primeiro conto infantil de Susana Afonso, com ilustrações de António Santos.
«Viver Paris ao som de um Pífaro – o Sonho de Jaques» constitui, segundo o presidente da editora, João Artur Pinto, “uma das apostas de que mais se orgulha a Labirinto, a de trazer a público novos valores literários. Aposta essa, que julgo ganha, quer pela diversidade e géneros literários já editados, quer pelo número crescente de autores e até mesmo pelos leitores conquistados”.
A sessão de lançamento decorrerá no próximo sábado, dia 21 de Junho, na Sede da Associação Cultural e recreativa de Fornelos, pelas 16horas, e contará, entre outros, com a presença do escritor Pompeu Miguel Martins, a quem caberá a missão de apresentar ao público presente a obra de Susana Afonso
Susana Marina Freitas Oliveira Afonso
Nascida a 09/12/1981 é natural do concelho de Fafe
Licenciada no curso de Professores do 1º Ciclo Variante, Educação Visual e Tecnológica pela Escola Superior de Educação de Fafe.
Frequentou múltiplas acções de formação complementares nas áreas da Música e do teatro.
Actualmente lecciona na Associação Cultural e Recreativa de Fornelos e é professora co-tiular do 1º ciclo nas áreas curriculares disciplinares de Educação Visual e Tecnológica; Educação Moral e Religiosa Católica.
Foi co-fundadora do Grupo de Teatro de Travassós – Fafe; Coordena o Grupo de Teatro de Rebordelo – Amarante.
E é promotora da Oficina de Teatro da A.C.R. de Fornelos.
Desenvolve no momento a investigação preliminar para Doutoramento nas Áreas da Expressão Musical e do Autismo.
segunda-feira, 16 de junho de 2008
"Cartas Poéticas" Entre António Ramos Rosa e Manuel Madeira
Dois poetas – António Ramos Rosa, já hoje considerado o mais premiado dos poetas portugueses vivos e Manuel Madeira, outra referência marcante da poesia moderna portuguesa - tornam públicas 134 cartas, das muitas que trocaram entre si, ao longo da vida.
São textos poéticos de reflexão, de auscultação, de intimidade, nascidos de um conhecimento mútuo destes dois poetas. São epístolas iluminadas por uma confidencialidade deliberada, expressão do estranho modo de conceber e partilhar, assente na poeira dos dias e no anseio da luz contemporânea da suprema arte de revelar os seres e as coisas.
De uma forma quase diarística, ambos evocam o tempo que foi, naquele presente/passado feito de cumplicidade, de modo a permitir estremecer o instante de futuro, vivido pessoalissimamente, de um futuro que ainda não o é, e sempre se colocou como saudade do presente.
“Os passos que damos vão através do tempo, / ou seja do que não é ainda e está a ser já / É este vazio que se preenche que é o tempo, / que não é vazio em si mas para nós” (ARR)
“Consubstanciamos o passado e o presente / (…) na trajectória imemorial do tempo” (MM)
Ramos Rosa e Manuel Madeira invocam vivências traduzíveis, lugares da infância, estações da adolescência, planos de acção e de lazer, numa mesma perspectiva de ideologia, porventura retidos numa visão quase esquecida e secreta, metaforicamente trazida ao instante da escrita de uma forma real e plena de autenticidade.
E nessa rememoração perseguida, perscrutante, nesse tacteamento sensitivo relevam afloramentos de impenitentes revoltas juvenis, de um tempo remoto de não regresso e ainda por explicar, que devolve a todo o momento a nostalgia de um outro, mais “medonho”, que “nos apertava os pulsos e tolhia os movimentos”, um tempo em que “os livros chegavam por invisíveis correios”, um tempo de balanço dos rescaldos, de desejos não enunciados, de um contrariar insolvente, um tempo estriado na vida resistente.
Nesse trazer de novo, eis duas vidas consubstanciadas num conhecimento contemplativo, de reflexão, de impressionabilidade.
Em Ramos Rosa deparamos com um saber poético que o leva a olhar com desvanecimento o futuro da poesia sob o signo do “fazer poético”, preponderando no poema aquilo que mais seguramente habilita um poeta a sê-lo ao nível dos grandes, a fidelidade à palavra que no homem é a verdade última do sangue, da existência e da alma.
Em Manuel Madeira, sobressai a metaforização tácita, construída sobre um desenho leve, quase musical, seguidor de contornos indefinidos, a adjectivação eloquente e procurada, a fulgurante inebriação das ideias exposta com a simplicidade de quem adoptou a poesia como companheira de uma vida.
A obra deste poeta, revela uma espécie de metempsicose panteísta, toda ela feita de fidelidade à terra, onde mergulham as raízes mais fundas e de onde tudo volta a emergir para uma reconciliação universal, para uma suprema harmonia entre a luz e a sombra, plenitude e carência, presença e ausência.
Ambos os poetas correspondentes estão há muito no limite físico da poesia, sob o signo da profecia e da interrogação.
O que eles realizam, esse transformar a existência em existência poética, esse apoderar-se dos poderes que talvez só a mitologia possa conferir apenas a um semideus, e tentarem dominar com eles as várias faces de um destino, porventura adverso, até converter toda a realidade em realidade poética não é uma aventura vulgar para qualquer criador de arte.
Esta poderosa aventura, que encetaram e percorrem, é uma forma subtil de apagar os poderes temíveis que não deixariam sossegar o Homem se ele se atrevesse a imaginá-los reais.
Assim, no real convertido em mito tornava-se impossível imaginar que o mito pudesse ser real. É que, desde tempos imemoriais, cada poeta foi a verdade da sua própria poesia e com ela preparou os caminhos de muitos outros poetas que lhes sucederam.
Hoje, carteando-se, António e Manuel trazem-nos a poesia através de uma coloquial lembrança com o leitor, correndo todos os riscos de encarnarem a imaginação na vida, e todos os perigos, que desse gesto possam derivar.
Nestas “Cartas Poéticas” vive o primado do espírito poético, numa permanente interrogação e constatação, estreito espaço onde a uma folha se achega outra, onde cada pausa é interrompida por nova carta, nova ideia vem espreitar um lamento, novas certezas vingam dúvidas que porventura possam existir.
Aqui, a palavra poética assume uma presença vigorosa, mas também encantatória, mágica, activa, subtilmente reveladora e superante.
São 134 cartas em concatenação precisa, sem desvio do olhar, sem se deixar de sentir o respirar que as anima, onde cada autor sucede o outro, sucedendo-se a si mesmos, num discurso poético rigorosamente construído, afectivamente correspondido.
Nestas missivas, Ramos Rosa e Manuel Madeira são os leitores por excelência deles próprios. Acompanhando-os, estamos nós, os leitores das suas obras, em particular destas cartas.
Temos, pois, dois poetas maiores. Duas almas de eleição.
Com António e Manuel estamos perante uma poética baseada na atitude testemunhal, na revivência do “eu” e do “tu” no que a epistolografia pode exprimir, e que implica necessariamente a condição intersubjectiva do discurso, o conhecimento da própria criação, a comunidade e a comunhão dos sujeitos no horizonte da expressão poética. E o testemunho pressupõe a fidelidade como princípio na contínua relação transformadora do sujeito com os outros.
“Vejo o sol mas não sei se quero ver o sol / se ele nada me sugere para além da sua luz de cal / e assim sinto o vislumbre de um logro, um luminoso sofisma. / Prefiro estar no interior de uma nuvem silenciosa / e ver a terra na sua ondulação azul / com os seus deslumbrantes pomares as suas tranquilas florestas / como se ela fosse a mão pródiga de veias solares / e de ramos sinuosamente entrelaçados / como uma fêmea nua de voluptuosa pujança.”
(…) “Não, o sol não chega para apagar a monotonia cinzenta / deste árido círculo em que perdemos o rumo / dos vergéis azuis e dos estuários brancos” ARR (51)
“Ter a margem de um rio tranquilo para companhia / é uma ajuda inestimável e eu vou contigo nessa caminhada / acompanhados pelos eucaliptos e pelas nuvens / meditando em silêncio como nós e o vento que não fala” (41)
(…) “Espero alcançar a compreensão do caos / dissolver-me em estilhas na amplidão do espaço” MM (27)
Por esse tempo, o tempo epistolográfico de António e de Manuel, o fogo da criação esteve para além das privações, do exílio das profundezas, das grandes causas pelas quais estes dois poetas lutaram, do sentimento do abandono que experimentaram nos seus próprios percursos, em termos artísticos e de concidadania.
Eles foram, o que eles, mesmos, se fizeram e são.
Fiéis a eles próprios, e às suas ideias, coerentemente porfiando em campos de acção diversos, conscientes das suas obrigações de expressão, de divulgação da mensagem e da palavra poética.
Criadores de arte por excelência, na obra de qualquer destes poetas, são visíveis, uma experiência poética depurada, um crescimento cada vez maior de pendor meditativo e uma concisa e rigorosa perfeição da linguagem. Eis, por conseguinte, exemplificado, um novo modo de dizer, talvez o dizer até ao “grau zero” da linguagem e suprimido pelo não dizer, como nos deixou dito Rolland Barthes.
A cada carta, carta que se lê, carta que se responde, o acto criativo nasce como onda sufocante de seiva, como movimento inteligível na aragem da tarde e nos ombros da noite, metamorfoseando-se continuamente no texto poético, essa morada última das sombras dos mitos.
E entra, então, como coisa estranha e nova nesse tempo volvido, líquido, em que “havia cegos e surdos que falavam / e nos queriam cegar e ensurdecer” (ARR) (28), e entra igualmente através do olhar como mediador da consciência, matéria em dissolução, poeira dos memorializáveis momentos que se grita, acarretando a esperança de se poder restituir à luz essa ânsia dolorosa de penetrar o segredo das coisas, da descoberta finita do infinito.
Os poetas correspondem-se, lembrando o deslizar sonante e misterioso da adolescência, da juventude que exigia o sacrifício sublime da água, o enleio esgotante e mitigado de um tempo de luta, quando a vida se devia abrir nas páginas escorreitas e alvas de um livro e apetecia fugir à rotina dos dias, ao corrupio enfadonho das horas, encadeados eles mesmos pelas luzes que os absorviam.
Por esse tempo…
Por esse inolvidável e criativo tempo de descoberta… sente-se como Madeira o afirma, o inadiável “apelo das vozes distantes”…
ARR - “Era um horizonte de palavras novas, de árvores reverentes. / escrevíamos panfletos que às vezes nos fugiam dos bolsos / em revoadas que se confundiam com as aves. / Acampávamos em pinhais, cantávamos e dançávamos, / saudando o sol de um novo dia / e às vezes a polícia surpreendia-nos / com as metralhadoras aperradas contra nós. / Devorávamos livros proibidos apaixonadamente / reunidos em exíguos quartos ou solitariamente. / Não importa se muitos se enganavam adorando um déspota como um deus, / porque a verdade estava na sua oposição / à tirania que nos roubava o sol, / à liberdade e à justiça da palavra viva. / Vivemos duramente com obstinada paixão / mas vivíamos solidários e lúcidos na sombra / e a fraternidade era a nossa força e o prémio da nossa luta. / Vencemos finalmente, mas a madrugada da nossa liberdade / foi apenas um momento. O que se seguiu depois / é um sistema que não sabemos como combater / porque a sua teia é anónima, de uma violência esparsa / que nos impede a defrontação / com os seus disfarces e os seus estratagemas.”
Na frente do poema segue a luz, a plenitude tracejante do seu próprio movimento originário, o aceno familiar à ansiedade juvenil, às manhãs sem memória, à maturidade outonal e doirada da lembrança.
Nestas cartas, deparamos com a alegria do que se descobre e é exposto, uma serena alegria imorredoira. É que a poesia transcende – sempre, sempre - a simples comunhão a dois.
MM – “Vem de muito longe a nossa amizade fraterna / querido amigo António e o tempo então era jovem e sorria / e brincava desfolhando pétalas de alegria que nos atirava / por cima dos carcomidos muros que o ocultavam / (…) Manietados pelo medo e pela sombra da pide / que nos perseguia em plenos passeios / como aconteceu uma vez em Silves feitos prisioneiros / escondíamos os livros proibidos no chão dos quintais / e engolíamos papéis comprometedores em pedacinhos / durante os interrogatórios simulando soluços iludindo os esbirros / mas explodíamos em palavras e gestos eufóricos / quando nos encontrávamos casualmente na rua / como se tivéssemos encontrado a felicidade no inóspito deserto / Éramos tímidos e pobres mas trazíamos nos bolsos da alma / virtuais quantias fabulosas de valor incalculável” (…) “ que agora distribuíamos clandestinamente / em maços de panfletos cantando a liberdade / contra a ignorância e os seus dominantes exploradores / que viam em nós inimigos a abater” (…) (51ª Carta)
A perseguição política sangra abertamente no leito deste poema, verdadeiro alerta aos seres e aos olhares, invocando a dolorosa e combativa epopeia contra as forças fascistas.
Por esse tempo de juventude, estes jovens penetravam o segredo das coisas, sentiam a evocação dos sentimentos, de um acontecer que acabou por se ir estruturando nos dias. Vigiavam as enormes distâncias que vão das imagens às ideias, da história humana e da liberdade coarctada, a evocação do tempo das religiões dos mistérios, das que estão a morrer há muitos séculos, das que só os poetas entendem. É que muitos dos sentimentos e dos projectos dessas manhãs que percorreram as vidas destes dois autores na “imensa toalha do firmamento inteiramente desdobrada / numa plenitude que superava toda a sabedoria e era mais pura do que todas as preces” (MM) (12) vieram muito mais tarde a coincidir com os projectos de muitos de nós.
Cada um recorda-se, e recorda a imagem do tempo próprio e o tempo/ imagem que lhe pertenceu, trecho a trecho, carta a carta, deslizando pela espiral dos tempos, envolvido nas águas ocultas do desabrochar das consciências, em especial da consciência política que os ia invadindo.
E em cada elegia singular, pela dimensão poética, surge esse campo de sugestão e afectividade das palavras, as palavras no seu poder supremo, tal como as referiu Cecília Meireles do outro lado do Atlântico: “Ai, palavras, ai, palavras, que estranha potência a vossa! Ai, palavras, ai palavras, que estranha potência a vossa!”
Nestes textos epistolares, a variação referencial das palavras, com os seus ritmos, as suas intenções, passa pela sensibilidade plena do sentido, pela entoação que ficou perdida, pela sua própria memória colectiva e individual, acompanhando os movimentos da metáfora simbólica.
No entanto, quer na poesia de António, quer na de Manuel, surgem claridades - mais luminosas do que a água que espelha a luz – claridades que se avizinham na curva descendente dos dias passados, provocando na sequência epistolar um sentido de plenitude e de esperança, passados que foram tempos do maravilhoso, onde a invenção da dor, do intimismo e do constrangimento não deveriam ter tido lugar.
Na leitura desta estranha e sedutora poesia, ora matinal e clara como a adolescência, ora imbuída de toda a elegia do pretérito imperfeito, sentimo-nos tocados por uma densidade tão intensa, quanto à própria poesia entre nós tem sido possível atingi-la. É que aqui neste brotar memoriável, todas as raízes da inquietação e da procura da forma poética souberam impor uma humana medida a todos os recursos modernos da poesia. Nestas últimas décadas, a obra de António Ramos Rosa foi pontualmente frequentada e prezada por poetas e críticos, e por numerosos leitores.
Existe uma quase unanimidade em relevar em António a inventiva imagística, o fascínio do secreto e do simples, o simbólico constante, o tratamento rítmico ou melódico do verso, a sequência dedutiva oralizante, o exercício dos sentidos (vista, ouvido, tacto), as emoções elipticamente condensadas, sensitivas, sensualmente harmónicas e afectivas.
Tudo isto fez da poesia de Ramos Rosa, uma poesia de requintada qualidade artística, verdadeira bíblia do conhecimento poético.
Manuel Madeira é, de outro modo, um caso único na Poesia Portuguesa. Desde sempre poeta, só muito tardiamente veio a publicar parte da sua obra, com a saída do livro a que deu o título “No Encalço do Real Inalcançável”, antologia de toda uma vida poeticamente vivida. Em Manuel, a poesia surge límpida e fluente, possuída de uma rara perfeição imagística, acompanhada de um fino e cortante sentido de musicalidade verbal, uma poesia que se pode classificar como discreta e serena, por vezes desenhada palavra a palavra, sem preocupações estilísticas, sem excessos de significação.
Manuel Madeira apresenta-se ora reflexivo, ora inconformado, poeta da nostalgia da unidade poética que pretende transmitir, semeador de “grãos de silêncio que hão-de germinar em courelas de luz”, fazendo do acto poético um contacto luminoso com a criação. Perseguindo a palavra e a sua transfiguração, ciente que só a poesia pode fertilizar o deserto da existência, ele próprio, o poeta, confessa a finitude do ser na simplicidade e na mágoa do olhar: “ Sou um pouco do ar que se respira / pequeno grão de areia sobre o chão ignoto / agulha de pinheiro em breve cinza…”
Este discurso poético a duas mãos – as cartas trocadas entre António Ramos Rosa e Manuel Madeira - é algo de singular no nosso tempo, espelho de fascínio e complexidade, colóquio pensante, osmose quase perfeita entre realidade e palavra, assunção do verso como expressão intimista, lugar supremo de rememorações e vigílias. Para além do enriquecimento que a sua leitura poderá proporcionar a todos nós, estas “Cartas Poéticas” são - já - um monumento ímpar na Poesia Epistolar portuguesa, do nosso tempo.
«Ciclo de Criação Imperfeita» de Seomara da Veiga Ferreira
DE SEOMARA DA VEIGA FERREIRA
Ajudar a repôr no mundo um livro, atribuir-lhe uma nova existência, querendo fazer com que, tal como Fénix renasça das próprias cinzas, e ignorando a sua anterior existência, se fale dele imaginando ser este o seu verdadeiro início, seu princípio de fala-escrita, seu parto, seu lado de luz primeira, é uma tarefa equívoca, ambígua. E tanto mais dúbia quando o seu conteúdo diz respeito à arte do voo.
Logo, na sua essência: ilusório.
E assim sendo, eis-nos em pleno terreno do indizível-dito, na abordagem da matéria do sonho, do intocado (mas não intocável.), do suspeitado, da transcendência.
Ou seja: trata-se de poesia.
No presente caso, um livro que deixou para trás um outro nome, como uma gasta pele de cobra, e aqui aparece hoje com o seu título actualizado, que em si mesmo já se auto-avalia: «Ciclo de Criação Imperfeita», de autoria de Seomara da Veiga Ferreira, escritora por demais conhecida, autora de uma excelente obra ficcional.
Mas, e há sempre um mas em tudo, a Seomara, ela própria embora sob pseudónimo, tinha no seu passado, ou melhor, tinha na sua história um volume de poemas editado, que ela num acto de revolta contra as gralhas e os inevitáveis erros de tipografia, rejeitara. Deitara fora, abandonara num acto de rebeldia ilusória. Pois, habitualmente, aquilo que julgamos estar bem enterrado no passado, acaba por tornar até nós, para nos fitar nos olhos, quem sabe se a querer ajustar contas connosco. Mistérios e segredos, que a maior parte dos escritores ocultam nas suas tão míticas arcas ou gavetas sem fundo possível...
Assim sendo, numa espécie de facécia do destino, Seomara da Veiga Ferreira viu cair-lhe nas mãos a sua antiga poesia, a exigir-lhe ser reeditada, o que está a acontecer, depois de vista-lida e revista e emendada, burilada, aperfeiçoada pela sua autora, com uma sabedoria acrescentada pelos anos de muitos argutos e precisos romances, dos quais sou incondecional admiradora. Ajustamentos que, nos permitem ir mais fundo na sua matéria translúcida.
TELÚRICA E AVASSALADORA
Assim, em «Ciclo de Criação Imperfeita» acabamos por distinguir na sua matriz-raiz: o húmos, as águas, as nascentes, as emanações, as cisternas, o grão de fertilidade-criativa. Idênticas nas suas consistentes estruturas matriciais: literárias, fantasmáticas, filosóficas, àquelas a que a romancista já nos havia habituado. Digamos que, curiosamente, a obra futura de Seomara já estava toda ela contida nestes versos bravios e desassombrados, de uma inesperada força telúrica, quer na tessitura da sua linguagem, quer na sua transbordante contestação.
“Para bordar o diagrama do Universo
a minha fronte mordendo o Fogo e a Lua
num vulcão de lilases cristais.
Microscópicas abelhas de jade, a mel
ergueram a Pirâmide, o Círculo, a Fuga
no dorso sensual das auroras boreais.”
Em quantos romances desta escritora, não encontrámos, de diverso modo e estrutura literária, este discurso envolvente? Numa entrega tão completa e ardente à escrita, que nesta colectânea de versos poderá enganosamente levar a quem a lê, encontrar erotismo onde existe, isso sim: lava, incandescência, intemporalidade, envolvência cúmplice com a ira das deusas, com a seiva intocada da natureza.
Terra mãe.
“Vem a mim, abertos teus braços em flor!
segue de meu passo ao alter o trilho.
Deus está connosco no acto do amor
mesmo que não se gere um filho.
Vem à luz do sol, em pétalas e fruto
como se a verdade ainda existisse...
Eu sou a terra que não vês há muito
– a Terra Mãe sempre forte e triste.
(...)”
Poesia que em si mesma contém uma surpreendente dimensão clássica, toda ela, porém, erigida numa modernidade desconcertante. Sendo esta a faceta, o lado, o lastro que mais me fascina no conjunto destes versos, que através da sua leitura nos transporta até universos longíquos, onde tudo tinha uma grandiosidade, uma vastidão e esplendor. Uma alargada visão da vida em contraste absoluto com a pequenez dos nossos dias.
Aliás, são incontáveis as vezes que escutei a Seomara desabafar, sob o efeito da grande indignação que sempre lhe provoca a mediocridade, o comezinho, a hipocrisia, a intriga, a injustiça, o compadrio: “Eu não sou daqui, eu sou romana, Teresa, eu sou romana!”.
Eu diria antes que Seomara da Veiga Fereira é aquilo que escreve.
Com uma frontalidade, uma exactidão e um talento inegáveis.
DISCURSO FEMININO
Costuma dizer-se que a poesia não tem sexo, mas eu ao longo dos anos tenho vindo a afirmar o contrário, com obstinação. Não estando sózinha nesta certeza... A poetisa Sylvia Plath, perguntou com ironia no seu diário: “como é que a poesia não tem sexo, se até as cerejas tem sexo?” E a mãe da psicanálise, Melanie Klein, garantiu-nos, que “tudo tem sexo na vida”...
E eu acrescento: até os anjos! Os anjos que voam, também, por dentro de «Círculo de Criação Imperfeita», na realidade escrito entre 1968 e 1971, e que hoje reaparece, a fim de nos dar a ver um discurso com um registo mítico e feminino indiscutível: pelos meandros sinuosos da frontalidade, pela sua linguagem captiva e simultaneamente fatal, fiada através de uma sensibilidade feminina, inquieta e ferina, com palavras elaboradas a ponte de crivo e mar de onda, a vir beijar o corpo na sua quentura exposta, como os homens raramente têm usado-ousado escrever, desvendando...
“Vi-te nos tempos imemoriais da planície branca
quando erguias ao Crescente o cordeiro em Sumer.
Trazia no meu colo enrolada a ruiva trança
minha sagrada e forte, quente trança de mulher.
Pentei meus cabelos no vale estranho do Egipto
cobri meus seios de súplicas e de medos
e no Nilo aberto em concha, espuma e mirto
segui teu navio nos meus olhos negros.
Tocaste sem saber a fímbria do meu vestido
quando fugimos de Jerusalém incendiada
Vim ao ocidente brumoso, abrupto, altivo
na linha do oceano cavei a minha estrada.”
Marca da diferença.
Incendiada.
A escritora inglesa Virgínia Woolf, considerava que o pensamento feminino tinha necessidade de uma sintaxe diversa, a conferir às palavras um ritmo particular, com imagens “de fluidez”, de acordo com as múltiplas zonas de prazer oferecidas pelo corpo feminino, na sua plenitude. E acrescentava, sonsa e inteligente: “Não entendo o escândalo que se levanta quando se fala de escrita feminina, pois quanto a mim, essa diferença só enriquece a literatura”.
Literatura, a que Seomara da Veiga Ferreira com a sua escrita lavrada no coração da coerência e da consciência, tem acrescentado vertigem, investigação, rigor e intensidade. Obra que estes poemas, arrisco-me a dizer cabalísticos, cedo abandonados pelo caminho, ironicamente, acabam por vir quando menos se esperava, consolidar:
Com a sua influência histórica.
Com a sua profundidade.
Com a sua atadura de brilho e cintilação de diamante, feita de astros onde a vida e a literatura tomam forma.
Maria Teresa Horta
Lisboa, 4 de Junho de 2008
segunda-feira, 9 de junho de 2008
Estrelas Mínimas de Fernando Castro Branco, apresentado no Auditório Paulo Quintela - Bragança
Poesias sobre uma terra difícil, em processo de despovoamento, mas uma terra com a qual se estabelece uma relação luminosa, por mais pequena que seja. Esta poderá ser uma breve apresentação do livro “Estrelas Mínimas”, da autoria de Fernando de Castro Branco, autor nascido em Duas Igrejas, Miranda do Douro. O livro, editado pela Labirinto, vem na sequência de outros dois livros de poesia do mesmo autor e foi apresentado em Bragança no passado dia 29 de Maio. Segundo Fernando de Castro Branco, a obra tem 3 secções. Uma secção, a que dá o título ao livro, “Estrelas Mínimas”, tem este nome “porque em relação às obras anteriores enveredei por uma poesia mais minimalista, mais depurada, e também porque tenta focar uma realidade da nossa terra, da nossa região, diria em decadência, em dificuldades”. Assim, estas sãos pequenas estrelas, “cintilam um pouco debilmente, mas que esperamos possam ressurgir”. A segunda parte do livro, designada “Poemas para um Rio”, procura retratar a relação do autor com o Rio Douro. Tendo nascido no concelho de Miranda do Douro, onde o rio entra em Portugal, Fanando de Castro Branco viveu 22 anos no Porto. “O Rio Douro é um rio que traça o meu percurso, da origem à foz. Há aí uma vivência relacionada com a minha passagem pelo Porto, com as minhas memórias do Porto”, explicou. A terceira parte, a que chama “Turismo a Céu Aberto”, trata-se de “um capítulo duro e de intervenção, nunca abdicando da linguagem poética, mas procurando testemunhar ou denunciar uma realidade das nossas aldeias, sobretudo do Planalto Mirandês, em desertificação, abandono dos campos, da agricultura”. Este é o quarto livro do autor que tem já dois novos livros de poesia em preparação, um para sair em breve, outro para sair em Novembro. “É o meu quarto livro, sendo o terceiro de poesia, um outro é de ensaios. Foi uma aventura em que eu me lancei há três anos e depois pensei que seria algo de efémero, mas está a superar as expectativas”. O livro que sairá no próximo Outono encerrará o ciclo de poemas inspirados na relação do autor com a sua terra. Com o título “Canção dos Horizontes”, esta será uma obra a “duas mãos”, já que além da poesia inclui fotografias de Fernando Cordeiro. Entretanto, ainda antes de Agosto será lançado o Plantas Hidropónicas”, que apresenta uma poesia diferente, ou menos ligada à terra natal.
Lançamento do livro Ciclo de Criação Imperfeita de Seomara da Veiga Ferreira
Numa sala repleta de público caloroso, o Editor, João Artur Pinto, deu as boas – vindas à autora, nesta Editora de Poesia.
Seomara da Veiga Ferreira tem-se dedicado fundamentalmente ao romance histórico que edita na Editora Presença. João Artur Pinto, enunciando as linhas editoriais que norteiam a Editora Labirinto, nas quais salientou o gosto pela poesia, o respeito pelos autores e pelas outras Editoras, tendo felicitado o Dr. Manuel Aquino, um dos Editores da Editorial Presença, pela gentileza da sua presença no evento, indiciando uma salutar e convergente convivência.
A apresentação da obra coube a Maria Teresa Horta, profunda conhecedora da obra da autora que, mais uma vez nos traçou, com a sua acutilância e a sua sensibilidade poética, as linhas de leitura desta obra de poesia.
A leitura de poemas esteve a cargo de Isabel Wolmar.
Seomara da Veiga Ferreira, em breves palavras, traçou uma evolução da história da poesia, desde os tempos proto-históricos até à actualidade, vincando a importância da acção dos sacerdotes da Antiguidade na sua tentativa de contacto com os deuses, tendo sempre como mediadora a poesia, citando os gregos que consideravam os poetas antigos como “Os filhos dilectos dos deuses”.
Terminou a sua intervenção, agradecendo a presença do público, a apresentação da sua amiga Maria Teresa Horta, um dos vultos mais notáveis da literatura actual, e o trabalho impulsionador da poeta e investigadora Maria do Sameiro Barroso, bem como a leitura dos poemas por Isabel Wolmar.
Maria do Sameiro Barroso, membro do Conselho Editorial da Edirora Labirinto e coordenadora da edição, com capa de Júlio Cunha, que evocou as estátuas, as colunas e os templos que se reportam ao tempo histórico para o qual nos remete a poesia da autora, falou informalmente da sua amizade com a escritora e do primeiro contacto com esta obra de poesia, editada na sua juventude, que pode ser apreciada agora, nesta edição, reorganizada e revista, a mas cujo valor poético permanece intacto.
sexta-feira, 6 de junho de 2008
"ROSA INTACTA" de ANTÓNIO RAMOS ROSA
de ANTÓNIO RAMOS ROSA
“Rosa Intacta”, é uma experiência surpreendente dentro da poética de António Ramos Rosa. Apesar de tudo logo reconhecível, pelo vibrante e rigoroso modo dele construir a poesia, a talhar cada palavra, a conceber cada verso, com o seu modo inconfundível. Seguindo um mesmo traço-lastro-rasto: de claridade intensa do sul e do solar, do sal da aragem marítima, trepando rutilante, e talvez abstracto, pelas cordas mordidas pela salsugem dos mares e do sonhado.
Mas em “Rosa Intacta”, e pela primeira vez na poesia de António Ramos Rosa, curiosamente, o que era seguro tornou-se instabilidade. Quer dizer, tudo o que parece inteiro apenas simula sê-lo, e o que em princípio está incólume, indemne, é pelo contrário cousa frágil, franzina, fátua; matéria de partir e de quebrar, dúbia, ambígua na sua presença dúctil e dual, naquilo que surge como sendo corpo no poema e, simultaneamente, corpo do poema. Portanto, poema a transfigurar-se em corpo feminino, mas logo tornando-se, antes de mais, corpo da própria literatura.
No entanto, erótico?
É preciso dizer, que durante a leitura destes poemas escritos há cerca de vinte anos, e que só agora Ramos Rosa reúne, interligando-os num mesmo elo entrançado, num mesmo laço e nó, abraço-baraço, fica por demais evidente haver neste livro uma veemente intenção erótica. E essa será a sua marca de água: diferindo da maioria das obras literárias do género, pela interna interacção recíproca na abordagem dos contrários. Ou seja, nele existe um discurso poético ao mesmo tempo iminentemente corporal e, por que não dizê-lo, de sensualidade amorosa. Organizando-se entre essa sensualidade extremada e a ascese, entre a abordagem do interdito e a transcendência. Entre a animalidade. – “Viva real animal”, como reconhece o poeta – e a imanência.
“ROSA ROSAE”
Discurso do desejo, pois, e da pureza.
Discurso que se assume na corporalidade, perpassando pelo tom daquilo a que Roland Barthes chamou “extrema solidão”.
Mas, sendo “Rosa Intacta” pujante e transbordante, de feminina nudez jubilosa, essa solidão parece anular-se, surgindo no seu lugar a luminosidade da escrita, por seu turno recriando a penumbra fascinante e indiscutível, onde os corpos se fundem, mas igualmente se confundem, vivificam no que lhes é proibido.
E “Rosa Intacta” contém esse júbilo, embora apenas como se fosse vulto na sua forma imprecisa, inflexão erótica caldeada pelo ritualismo, pelo lirismo, de onde se vai desprendendo uma imagética quase arcádica, enredada numa permanente toada ou gemido surdo. Através dos quais o corpo e a sexualidade da amante-amada se apresenta: idealizada, sonhada e fantasmática. Ou seja, sublimada pela voz do narrador-poeta-amante, que nos dá a ver uma mulher elaborada, moldada pelo olhar, pela poesia e pelo seu desejo ardoroso, que a inventa, a canta e a fantasia. Qual Pigmaleão, criando-a, afeiçoando-a, à imagem e semelhança daquilo que o seu imaginário mitifica, no que diz respeito ao entendimento do feminino.
Levando-a a transcender-se.
E mesmo assim permanecendo dual e dividida, entre o carnal e a espiritualidade. Porque, como explicou Lou Adreas Salomé: aquilo que “em nós rodopia de mais corporal e também de mais espiritual, pelo menos na aparência, e de mais supersticioso: liga-se totalmente ao corpo, mas também totalmente ao corpo enquanto símbolo, como hieróglifo fisiológico daquilo que desejaria deslizar na nossa alma pela porta dos sentidos, para neles despertar os sonhos mais audaciosos: misturando pois, a posse e o vago sentimento do inacessível”.
MINHA ÚNICA
Referindo o modo como o desejo e o amor “fazem de nós criadores para lá das nossas forças. Eleva-os ao papel de encarnação de toda a busca, não só entre nós e o nosso objecto de desejo erótico, mas também entre nós e todo o alto valor na direcção do qual projectamos os nossos sonhos”.
“Com um cerrado ímpeto
abraçou-me.
Senti a tensão eléctrica do seu corpo,
a luxuriante suavidade de uma lua,
a verde plenitude da folhagem,
um frenesim sedento,
a lisa e longa voracidade de uma cobra,
a vertigem de uma estrela.”
Metáfora. Transfiguração. Metamorfose.
Portanto, ela, metáfora do sublime, mas terra, mas rosa de beleza intacta, ela sensual e excessiva e sedutora mas mater, mas única. – Minha única, como Abelardo tratava Heloisa nas cartas de amor que lhe enviava. E António Ramos Rosa, em parte, confirma-lhe a exaltação amorosa, neste verso: “Era a primeira mulher, a única, a de sempre”.
Aquela, pois, que é feita do mesmo material das deusas, das parcas, das ninfas, das corças. Aquela que se equipara à natureza, perto dos “incandescentes cimos”, dos rios e do arvoredo, “da argila plenamente solar” e das “redondas dunas”...
Digamos, da própria criação liberta.
Mulher inicial, ou mito-realidade; mitificada a partir da sua essência, num mágico fusionamento: água, fogo, argila.
Musa.
Tão perto e magnífica, mas afinal inacessível. E embora terrena tão distanciada e intocada-intocável. Em “Rosa Intacta”, inserida na categoria dos elementos naturais, emergindo das forças arcaicas
“Quantos prodígios exactos nesse corpo
de simetrias ardentes, de redondas geometrias!
Lavrado pelo vento, modelado pelo fogo,
polido pela água, de incandescentes cimos,
de espumantes funduras sequiosas!
Dir-se-ia um ramo do esplendor o torso oblíquo
onde dois pequenos e redondos seios latejam.
Dir-se-ia um navio pela alta simetria
das suas pernas brancas. E que dizer do rosto?
Talvez três palavras: estrela, alma, água. (...)”
Estrela: portanto, inatingível.
Alma: portanto intocável.
Água: portanto indizível na sua esquiveza fria.
CORPO FEMININO
Na verdade, mais do que mulher comum, natureza. Ou melhor ainda: mais do que corpo feminino: corpo da própria natureza. E que neste livro de António Ramos Rosa, se transmuta, tal como os sentimentos neles incendiados: plenitude, desejo, amor...
Sentimentos que em “Rosa Intacta” se sublimam em criação estética. E como escreveu Roland Barthes: “Fizeram-nos acreditar que o amor podia, devia sublimar-se em criação estética: o mito socrático (amar serve para criar uma multidão de belos e magníficos discursos) e o mito romântico”.
O corpo-mito, portanto, através da fala poética, na simulaçãp da posse perante o anseio e o apelo do inacessível. Na (im)possível instrução da amada; e nesse jogo equívoco, surge igualmente o desejo que ela desencadeia.
Ela, objecto erótico. Aquela pela qual se anseia.
O lado oposto do masculino: Outra. A estranha, a misteriosa, a insondável, o “continente negro” de que falava Freud, a indesvendável, a enigmática acerca da qual António Ramos Rosa escreveu no primeiro poema de “Rosa Intacta”, dedicado, significativamente, “À mulher em carne viva”:
Viva real animal no teu acto soberano
soberana oferenda
nunca vivida antes
sempre e nunca
num único momento ignorado
na minha sede
no meu ardor sem exemplo
no espanto do teu mistério de mulher (...)”
Mas, em “Rosa Intacta”existe uma mulher real, de face límpida e clara, num último poema inesperado, para mim o mais belo de todos os poemas deste livro. De uma carnalidade cintilante, plena, perfeita.
A sua face é a minha lâmpada,
acordo com ela e sigo no meu barco.
Sinto-lhe o hálito e o odor a maresia
a redonda força dos joelhos.
Vou palpando palavras nos seus músculos
ou nos seus duros tendões flexíveis.
Por vezes vou colher um vertiginoso vocábulo
no violento navio das suas ancas.
Quando adormece na sossegada hora
também adormeço sob o doce peso
das suas pálpebras.
A água ondula sob a luz resplandecente
e ela é a tranquila felicidade do instante.
Só a brisa conduz o delicado barco
feito de folhas e de pequenas aves.
Neste maravilhoso instante de sossego
a alma está inteira com o seu amante
plenamente aberta na respiração perfeita.
Erotismo? – torno a perguntar, duvidando. Experiência mística, afirmaria Georges Bataille: “a poesia leva ao mesmo ponto que leva cada forma de erotismo; à indistinção, à confusão de objectos distintos. Ela leva-nos à eternidade, ela leva-nos à morte, à continuidade.”
Ou seja, não importa se “Rosa Intacta” é ou não poesia erótica. Interessa que é excelente poesia.
E termino, citando Rimbaud:
“A poesia é a eternidade. É o mar indo com o sol”.
quarta-feira, 4 de junho de 2008
PRÉMIO DE POESIA DO NÚCLEO DE ARTES E LETRAS DE FAFE
sábado, 31 de maio de 2008
Ciclo de Criação Imperfeita, na Livraria Barata
Do ponto de vista literário, tem-se dedicado à publicação de romances históricos, na Editorial Presença. Entre 1993 e 2007, publicou Memórias de Agripina, que recebeu o Prémio Eça de Queiroz de Literatura da Câmara Municipal de Lisboa, em 1993; A Crónica Esquecida d’El-rei D. João II, ao qual foi, por unanimidade, atribuído o Prémio de Prosa e Ficção Eça de Queiroz de Literatura, em 1995; Leonor Teles ou o Canto da Salamandra; Vieira, o Fogo e a Rosa e Inês de Castro - A Estalagem dos Assombros, tendo, no prelo, outro romance que se situa na Roma Imperial.
Foi coautora de um programa para a RTP Os Romanos entre nós.
Iniciou a sua carreira literária com a publicação de poesia, na Folha Literária do Jornal O Século.
A presente obra será apresentada pela escritora e jornalista Maria Teresa Horta. Haverá leitura de poemas pela actriz Isabel Wolmar.
terça-feira, 27 de maio de 2008
«Estrelas Mínimas» de Fernando Castro Branco, no Auditório Paulo Quintela - Bragança
"Estrelas Mínimas", quarto livro de poesia de Fernando de Castro Branco, é uma obra que se abastece em memórias, afectos, lugares, gentes. Poemas que partem de uma genuína emoção estética, sem que em algum momento isso possa conflituar com o essencial trabalho sobre a linguagem que deverá ser sempre o fundamento de qualquer poesia que se preze.
Livro depurado, e despojado, em relação ao arsenal retórico que foi apanágio dos livros anteriores do autor, não deixa de funcionar como um testemunho, e uma denúncia, em relação à decadência e à ruína de um mundo rural em acentuado estado de erosão e desertificação, completamente ostracizado por esses ventos ditos do progresso, das novas tecnologias, da vertigem de uma ideia de modernidade materialista, urbana, centralizadora, burocrata, inculta.
Livro melancólico, eivado da pós-moderna consciência infeliz, reunindo essas "estrelas mínimas" que ainda resistem na sua luz cadente, que a qualquer momento estão na iminência de regressar à nebulosa inicial, ou, quiçá, ainda possam ressurgir com um brilho inesperado.
«Dez anos de solidão» de Daniel Gonçalves, na Feira do Livro de Ponte da Barca
quarta-feira, 21 de maio de 2008
"As Vindimas da Noite" de Maria do Sameiro Barroso
Do livro destacamos dois poemas o poema que dá título ao livro, As Vindimas da Noite e o poema O Olhar da distância, dedicado a Fiama Hasse Pais Brandão e a Maria Teresa Dias Furtado:Maria do Sameiro Barroso, In "As Vindimas da Noite".
Poema retirado da obra "As Vindimas da Noite"
AS VINDIMAS DA NOITE
As ancas, os ombros, as falésias flutuariam,
na noite onde se despenham as ravinas,
o corpo insidioso arrastando o mar, a boca,
os joelhos sonâmbulos,
os barcos que se cobrem de limos, grãos de areia,
esquecimento.
As harpas do horizonte ergueram-se já,
como árvores frondosas.
Nas colmeias de sangue, fervilha a rosa,
a corola verde, o tumultuoso nome,
o timbre infinito.
As ancas, os ombros, as falésias flutuariam,
na noite,
no vazio errante de um coração silábico
que se abre, suspenso,
por dentro das estrelas, à deriva.
No vazio leve das miragens, esconde-se,
nas vindimas da noite,
o corpo dormente da eternidade que rebenta,
silenciosa,
nos punhais ébrios de salsa, cinza,
aspergindo, na névoa minuciosa,
o ruir das telhas, entre ervas, dedos,
acariciados lentamente.
Maria do Sameiro Barroso
Poema retirado da obra "As Vindimas da Noite"
O OLHAR DA DISTÂNCIA
Para Fiama Hasse Pais Brandão
e Maria Teresa Dias Furtado
As barcas partem sempre novas, renovadas.
No fôlego que habitou a noite,
a errância expandiu-se, talvez se expanda ainda,
sob as ondas que gritam mais alto
o sussurrar do vento.
Na sumária distância, a retina regista pausas, letras,
frutos e raízes que a serenidade transporta,
porque a amizade bebe as suas águas,
no silêncio sagrado,
bálsamo luminoso que mitiga a dor,
em seus lagos perenes, em seus laços incólumes.
Sobre relógios aquáticos, flutua um rosto,
uma mulher, o seu nome é fábula,
o seu olhar, talhado nos versos da natureza,
paira nas florestas,
onde os pássaros cantam ainda a noite antiga.
No labor oculto, o destino tece, destece,
sob o olhar que escurece,
as recordações recolhem a água, o rosto,
o mundo, o seu sorriso,
e o olhar de Medeia aparece, impresso
no coração das folhas rubras.
Maria do Sameiro Barroso
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